"Mudar o fim torna o começo errado. Num romance, o fim não é nada; no conto, ele é tudo'', disse Robert Louis Stevenson, o que me ensinou Moacyr Scliar. E partiu. Logo quando estávamos nos aproximando.
@negalilu acaba de fazer sua primeira publicação no Twitter, puxando conversar com a escritora gaúcha Cintia Moscovich.
Sigo (e persigo) as ficcionistas brasileiras contemporâneas, mais recentemente.
Meu amor é do tamanho da rede.
Maior do que imagino.
Menor do que poderia ser...
Fica combinado que, quando Péricles Cavalcanti se tornar leitor deste blog, sua canção mais linda gravada por Adriana Calcanhotto no álbum 'Cantada' será oficialmente dedicada à Lilu e Nega.
Sou Sua
Composição: Péricles Cavalcanti
Sou sua luz
Sou sua cruz
Sou sua flor
Sou sua jura
Sou sua cura
Pro mal do amor
Sou sua meia
Sou sua sereia
Cheia de sol
Sou sua lua
Sua carne crua
Sobre o lençol
Sou sua Amélia
Sou sua Ofélia
Sou sua foz
Sou sua fonte
Sou sua ponte
pro além de nós
Sou sua chita
Sua criptonita
Sou sua Lois
Sou sua jóia
Sou sua nóia
Sua outra voz
Sou sua
Sou sua
Sou sua
Plenamente
Simplesmente
Sou sua luz
Sou sua cruz
Sou sua flor
Sou sua jura
Sou sua cura
Pro mal do amor
Sou sua meia
Sou sua sereia
Cheia de sol
Sou sua lua
Sua carne crua
Sobre o lençol
Sou sua Amélia
Sou sua Ofélia
Sou sua foz
Sou sua fonte
Sou sua ponte
pro além de nós
Sou sua chita
Sua criptonita
Sou sua Lois
Sou sua jóia
Sou sua nóia
Sua outra voz
Sou sua
Sou sua
Sou sua
Plenamente
Simplesmente
Naquela noite de novembro, a gente buscava uma maneira de começar a produção conjunta do capítulo três de Sem palavras. Que abusado esse conto. Todo mundo sabe que conto não tem capítulo. Conto é conto, é curto, não pode se delongar senão vira novela. Mas Sem palavras nunca teve cabimento, demonstrou atrevimento desde a primeira frase escrita e ainda achou um jeito de se instalar dentro de um romance!
Lilu havia proposto o positivismo como método. Todo o trabalho deveria ser conduzido a partir de experimentação. Concordei porque depois de ter escrito dois capítulos já me faltava argumento para continuar a história e porque queria beijar muito aquele pescocinho.
A gente teclando ali, pela primeira vez, ainda sem saber como se daria a colaboração. Como aquilo era excitante.
Me lembro que ela sugeriu iniciar com um diálogo. Tudo bem.
Clássico? Pop?
Achei que não era pra ser daquele jeito e que seria melhor recomeçar. E foi se colocando à minha disposição é que Lilu surgiu com o texto inaugural da nova fase de produção: Sou sua. Escreveu, me fazendo silenciar.
A garota do chá estava na aula de Yoga quando cheguei pra malhar. Marília colada no espelho e eu à espreita no vidro, quando nos vimos. Ela ergueu a mão para fazer aquele gesto que termina com um toque no terceiro olho, me precipitei e dei um tchau bem casual, falando ao celular.
Era o amigo que vai se casar, me contando que tinha ido fazer as fotos do álbum nupcial. Um book?! Eles estão fazendo um book!! Que experiência maravilhosa... E eu pensando que as pessoas nem se casavam mais.
Pessoal afeito à Lomografia é que tem razão: o mundo é analógico. Seres humanos não se cansam do retorno às origens, geneticamente contagiados pelas variações do padrão "do pó ao pó" em quase tudo.
No meu caso, venho descobrindo que um certo comportamento cíclico ‒ que não sei se amo ou odeio ‒ tem muito a ver com a ausência de saciedade.
Não foi difícil descobrir que sou uma criatura exagerada, mas nunca investiguei por que às vezes o meu desejo não tem fim.
Ouvindo e observando mais o meu corpo nesses dias, percebo então que, rusticamente, saciedade pra mim é o cansaço. E não quero mais.
Desejo e aridez.
Morri.
Finalmente, luto em meu coração.
Mas falando sério, pra mim a paquera rola mais focada na academia onde todo aquele e aquela que malha já ouviu falar em Merleau-Ponty, um francês que tinha uma piração com o corpo.
Nessa piração, entre muitas outras coisas, o pesquisador concluiu que a existência do homem passa pelo sentido e que somente na vivência do próprio corpo encontra-se a chave da verdadeira percepção.
Minha psicoterapeuta respeita o cara e, esta semana, combinamos de discutir o assunto. Meu ponto de partida tem base nas noções merleaupontyanas simultâneas que o corpo possui: a reflexibilidade, que é atributo da consciência, e a visibilidade, que é propriedade do objeto.
Essa é minha mais recente estratégia para me manter "puxando ferro".
Dei flagrante nela olhando a minha bunda.
Da primeira vez eu pensei que ela estivesse conferindo o quanto precisarei malhar para adquirir o tal “bumbum de aço”. O que é perfeitamente normal, uma atividade já prevista para se cumprir o tempo de esteira, sem estressar. Aquele ali deve ter um projeto de carnaval porque ninguém faz abdominais com tanta gana, a jovem senhora parece tão distante, o outro bombadinho não pode fazer nada pela canela fina, uhu... peitão. Mas da segunda vez, me toquei: a academia pode ser um bom lugar para paquerar.
Teoricamente, bons lugares para paquera são aqueles onde encontramos pessoas que têm interesses similares aos da gente. Mas nem sempre é assim. Um casal amigo se conheceu na aula de balé. Ele era o único aluno da turma, também o pior. Havia escolhido a dança clássica apenas porque queria encontrar uma namorada e resolveu fazer uma busca focada.
Como não vou para nenhuma aula de balé, nem para bares lésbicos, vez ou outra arrisco a sorte numa sala virtual de bate papo e, mais recentemente, fico de olho na garota da academia. O nome dela é Marília.
Nos conhecemos quando ela veio do Paraná para cá e foi morar com uma amiga minha, publicitária. O reencontro foi durante uma aula de alongamento postural. É impressionante como ela parece não ter envelhecido um dia sequer. Talvez pelo fato de eu nunca ter reconhecido nela a juventude, porque há 15 anos Marília já sorria muito pouco. Sempre tão na dela.
Soube que se tornou empresária bem sucedida. Trabalha duro e vai relaxar toda noite na academia, lê revistas, come uma salada de frutas. Quando conversamos mais longamente, na sala de musculação, ela me contou que se separou do marido e que andava mal humorada. Então reconheci nela uma timidez atraente que havia me passado despercebida noutras ocasiões.
Se houver uma terceira vez, vou convidá-la para tomar um chá.
A gente fica ali prestando atenção na respiração, sentindo a musculatura da parte externa da coxa, fechando a escápula, apontando o dedão do pé para o teto, confirmando a presença dos glúteos. A academia pode ser um lugar bem solitário.
O blog está na rua.
Sou sua.
Sou só.
Sua.
Com traço marcante, solto, de estilo próprio, especializado na apropriação de formas, Mateus Dutra transita entre o desenho, a ilustração, as artes gráficas e as artes plásticas para transformar a obra literária 'Nega Lilu'.
A primeira etapa do trabalho prevê ações de intervenção urbana em 20 cidades brasileiras e em outros países, com registro fotográfico. Nesta fase, o projeto buscará explorar a poética contida na metáfora da mensagem guardada numa garrafa que é lançada ao mar, à deriva na imensidão, com pretensões de encontrar leitores, mas sem destinatário definido.
Na sua segunda etapa, após cumprido o circuito de intervenções urbanas, será o momento de transportar a obra para a galeria de arte.
'Mensagem na garrafa' representa um divisor de águas na trajetória do artista plástico Mateus Dutra que, nos últimos anos, tem se dedicado à criação figurativa no grafite, desenho e na pintura, em trabalhos difundidos nas ruas de cidades como Recife (PE), São Paulo (SP), Belo Horizonte (MG), Rio de Janeiro (RJ), Goiânia (GO), Porto Alegre (RS), Paris (França), Barcelona (Espanha), Santa Cruz de la Sierra (Bolívia), Bogotá (Colômbia), Hanoi (Vietnam), Linz (Austria), Windhoek (Namíbia), entre muitas outras.
Agora, a fim de explorar o universo da caligrafia, ele se utiliza de fragmentos do conto 'Sem Palavras' para exercitar criação na concepção de uma tipologia que traga não somente representação gráfica, mas identidade e memória emotiva às palavras que narram a breve história romântica de Nega e Lilu.
Assim como o blog NegaLilu, 'Mensagem na garrafa' é uma ação em curso do projeto Esfinge.
O projeto Esfinge constitui-se de um conjunto de ações artísticas inspiradas na essência da humanidade. Atividades realizadas em colaboração para difundir, comentar, transformar a obra literária 'Nega Lilu' a partir de linguagens integradas que originam, até o momento, diálogo com as artes visuais, o audiovisual, a fotografia, o design e a dança.
Tendo a literatura como indutora das demais manifestações, o projeto Esfinge se materializa dialogando com o espaço público em território urbano e circulando conteúdo nas redes virtuais.
No campo das artes visuais, o projeto se consuma por meio da ação 'Mensagem na garrafa', desenvolvida em duas etapas: intervenção urbana e exposição em galeria de arte.
Tendo como fonte de pesquisa a estética da Cidade, o artista plástico Mateus Dutra trabalha na concepção de uma tipologia original para a reprodução de fragmentos de texto do conto 'Sem Palavras', contido no romance literário de ficção ‘Nega Lilu’, ainda inédito. Dessa forma, ‘Mensagem na garrafa’ promove a publicação inaugural ‒ ainda que parcial ‒ deste conteúdo, cumprindo o papel de instigar leitores de todo o mundo a conhecer, por meio das artes visuais, a obra literária ‘NegaLilu’ em sua integralidade.
Para além da afixação de textos que possam ser observados e lidos pela população das cidades escolhidas no circuito de execução do projeto, a apropriação dos fragmentos do conto 'Sem Palavras' pelo artista Mateus Dutra traz para esta obra literária propriedades capazes de ressignificar o conteúdo trabalhado à medida que ele ganha status imagético. Dessa forma, o texto terá sua matriz semiológica pervertida, modificada, e a sua semântica enriquecida ao originar um segundo produto artístico a partir de uma só fonte.
29/04/2010 - 12h18
da Efe, em Bruxelas
Olivier Vandewalle passava suas férias navegando pelas costas britânicas quando arrancou uma página de seu caderno e decidiu contar sua aventura.
"Eu sou um menino de 14 anos e vivo na Bélgica. Não sei se você é uma criança, uma mulher ou um homem. Navego em um barco de 18 metros. Seu nome é Tamaris. Ao mesmo tempo em que escrevo esta carta acabamos de passar por Portland Bill, no litoral sul da Inglaterra. Partimos esta amanhã", dizia a mensagem.
A britânica Lorena Yates encontrou a mensagem na garrafa em Swanage, no sul da Inglaterra.
A inglesa não duvidou e com os únicos dados que tinha, o nome e o lugar de origem do autor da mensagem, decidiu buscá-lo no Facebook e 33 anos depois a mensagem recebeu uma resposta por intermédio da internet.
Quando o belga leu a mensagem de Lorena em seu perfil não sabia de que ela estava falando, mas, uma vez que ela mencionou o nome do barco, ele se recordou da mensagem que enviou quando era um adolescente.
Lilu finalmente telefona em resposta a meus recados deixados.
O celular toca, toca, pisca, treme.
Seu nome insistente como uma ideia fixa.
Não atendo.
Não atendo.
Silêncio.
Chamada perdida.
Choro.
Lençol embolado, no colchão vejo uma mancha vermelha. Coisa de mulher. A noite tinha sido longa e movimentada. Vanessa havia acordado de madrugada, tateou no escuro assustada e foi parar na cama da mamãe. De olhos bem aberto, me disse que tivera um sonho terrível, virou-se de lado e permitiu que a chuva embalasse nosso sono.
Despertador tocou às 7h07 e meus primeiros pensamentos foram para Lilu. Essa não! É ela de novo... Sou eu de novo.
Passei a perna direita por sobre o travesseiro e, de costas para a pequena, decidi dormir mais um pouco para sabotar o chamado de Lilu, na tentativa de que ele não me ocupasse inteira logo cedo.
Sempre que isso acontece, é como se uma forte conexão se estabelecesse entre nós ‒ como um corpo dentro do outro. E sinto nitidamente que Lilu precisa de mim.
Nesses dias, me mantenho ocupada. Depilação, massagem, leitura. Assumo pequenas tarefas, circulo pela cidade. Rola taquicardia no trânsito, às vezes. Vou para a academia malhar com profunda tristeza. Pratico silêncio budista e olho no espelho sem me reconhecer. Intuitiva confiante, busco comunicação por telefone, email, pombo correio, sinal de fumaça, mantra. Quando não sou correspondida, confirmo que ela necessita mesmo de ajuda.
Mas Lilu está sempre bem. E não está dentro de mim, realmente.
“Mamãe, eu sonhei que você tinha morrido e que o policial tinha dado um tiro na sua bochecha e que você não ia mais me abraçar porque você tinha ido pro céu”, era Vanessa acordando aos prantos. Nos abraçamos até que ela se acalmasse. O dia promete, pensei.
Meu amigo conhece criaturas estranhas, maiores de 40, que também curtem Beatles, com nomes esdrúxulos e projetos muito secretos desenvolvidos em quarto de apartamento. Um deles nunca conheceu o carinho e o desejo de alguém pelo seu corpo, seu beijo, seu cheiro. Amou sem ser amado, apenas.
Eu soube que, desde a adolescência, o seu maior conflito é domar a ansiedade que, durante o dia, o condena à desilusão e, à noite, o faz aguardar pela ausência permanente dos pais a fim de partir em busca de um grande amor. Alguém que o compreenda enfim, um homem.
Eu soube que, desde a adolescência, o seu maior conflito é domar a ansiedade que, durante o dia, o condena à desilusão e, à noite, o faz aguardar pela ausência permanente dos pais a fim de partir em busca de um grande amor. Alguém que o compreenda enfim, um homem.
Quando eu era jovem e escritora ficcionista que me levava a sério demais, olhando pro vazio ou mirando o fundo escuro do meu armário aromatizado de maconha, concebia meus personagens neuróticos parecidos com os amigos do amigo. Me dedicava ao detalhamento do perfil daqueles mais marcantes, correndo o risco de estar brincando de Deus na criação de seres alienígenas.
Com o tempo, descobri que essas pessoas circulam por aí, cometendo gafes, se maltratando, causando incômodo, buscando prazer e paz, vivendo a vida deles e se achando interessante. Como a gente.
O quiz musical dos anos 80 ocupou um terço do tempo em que estivemos juntos. Era quase meia noite pra mim e pro cara que se gaba de conhecer (e ter) cada uma das canções já gravadas pelos Beatles. Sujeito vai se casar no mês que vem e, no bar, conversa vai e conversa vem não houve dúvidas de que eu tinha ali um amigo tão distante quanto incrivelmente próximo.
Como se fosse um daqueles bota-foras que antecedem a entrada na igreja, cativante e transparente, desta vez ele me contou mais alguns detalhes temperados sobre o seu romance acabado. Uma paixão alucinada, enterrada sem que ninguém tenha falecido. Quatro a cinco trepadas ao dia? Em qualquer lugar? Ah, isso não morre nunca, pensei.
Pra gente como eu, cuja caixa d’água não tem bóia, um romance assim é um chamado sem volta para me embrenhar feliz no sertão de Guimarães. Quem sabe uma história para meu segundo livro, desta vez inspirado em fatos reais... Cinco trepadas ao dia não é muito comum, mas existe, garantiu o amigo.
O que importa é que tem gente que sabe o que é isso e como é isso: disposição exclusiva, escravidão de pensamento, perfume do mel rescendendo no ar, desidratação, cama quebrada, entre outros detalhes que possam credenciar tal história no território das humanidades.
Mas ocorre também do amor não surgir na vida das pessoas com intensidade, ressonância, correspondência, muito menos com plenitude. Ocorre do amor não ocorrer.
Ela pediu pra avisar que não é assombração.
No primeiro comentário espontâneo feito no blog secreto de Nega e Lilu, alguém vem dizer que acredita na gente, na nossa existência.
Bonito isso!
Agradeço, Paulo.
O que você acha, Lilu?
Sim, eu sei... tem a poética esquizofrênica que acompanha a obra, o ficcionismo declarado, coisa e tal. Mas verdade é que o leitor sacou a gente de um jeito, sentiu alguma coisa lendo nossas coisas e não se convenceu.
Na dúvida, vamos tirar a prova dos nove: se você existe, Lilu, aparece pra mim. Agora!
Eu estarei aqui...
É louca.
É louca.
Guarda pra mim num baú enterrado um amor tão puro que é só meu.
Mas não sabe onde colocou o mapa do tesouro. Também perdeu a chave.
Deseja encontrar um momento adequado para nova expedição com dedicação exclusiva.
Se minha presença te transforma isso não quer dizer que eu te faça tão bem quanto você me faz.
Não há tempo nem espaço para apêndices.
Cada dia sou mais a Nega.
E você é mais Lilu.
Somos obra de ficção.