Paradas sobrenaturais e quânticas

quinta-feira, agosto 09, 2012


A Nega preferia não dormir. Nas últimas semanas, rotina era estender o dia para a noite e esperar clarear pra se deitar exausta, sem assunto pra repassar no cineminha da cabeça. A paranoia recomendava que evitasse a entrada no quarto e ignorasse a cama. Mantendo o rigor da proposta, passava apenas rapidamente por ali para se vestir, despir, vestir, despir, sem olhar para ela.

Naqueles dias, não raras eram as manhãs em que a Nega despertava, após as 10 horas, esparramada no sofá ou no tapete da sala. Um gosto de inverno na boca. A visualização instantânea do mapa de tarefas a cumprir. Mas só se levantava quando a fome a puxasse pelo braço, a conduzindo até a geladeira pra começar o dia antes de fazer xixi e reiniciar o boicote ao sono.

Porque deitada na cama, se submetia involuntária à escravidão de pensamento em Lilu. Virando de um lado para o outro, com o travesseiro entre as pernas, bem pertinho da xoxota, era onde estabelecia conexões sobrenaturais e quânticas com a Flor de Cajueiro. Sem esforço físico, se transportava pulsando para o campo energético em que ela vibrava. 

Sonhos recorrentes ocupavam também seu abrir e fechar de olhos e, ao acordar, muitas vezes ainda degustava gélida e tênue sensação que encontrava plenitude se evolando. Voltava de lá com sede e amarrotada na pele. Seu corpo não suportaria por muito mais tempo viagens astrais. 


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