Sem Palavras: 1 jan 2010 - 19h48
domingo, janeiro 01, 2012
Capítulo III (em progresso) - Parte 2
de Laura
Passing <laura.passing@gmail.com>
para Brisa
Marin <eusoubrisa@gmail.com>
data 1
de janeiro de 2010 19:48
assunto Capítulo
III (em progresso) - Parte 2
enviado por gmail.com
Sem Palavras
Capítulo III
Sou sua.
Acordei vazia. E de olhos parados, como
uma boneca de pano.
Fiquei quietinha entendendo algumas
coisas. Revisitei nossa história de lá pra cá e de cá pra lá. Havia neblina em
meus pensamentos. Será que perdi alguma coisa ou alguém?
O dia nasceu sem que eu ouvisse uma
palavra de Gabriela. Na madrugada, o último sussurro havia soado pra mim como
aramaico.
Corpos encaixados. Relevos. Estaríamos
contidas uma na outra enquanto durasse aquele contato livre, misterioso e
aberto, mas limitado em seu espaço e tempo. Como um segundo cristalizado.
— Angelina...
Breve suspiro responde.
Na noite em que passamos juntas, Gabriela
não quis dormir, optou pelas descobertas. No princípio, havia dito que preferia
as sutilezas, mas entregou-se ao naturalismo. Me mordeu inteira, explorou minha
geografia conforme anunciado. Deixou marcas na epiderme. Não me esquecerei da
movimentação cheia de sensualidade, como a sua capoeira.
O contorno de seus seios ficou gravado em
minha retina. Permaneci excitada por dias a fio, especialmente no trânsito.
Passei horas organizando nossa trilha sonora. Listei coisas que quis fazer com
você. Tudo enquanto você esteve ausente.
No passar dos dias sem te encontrar, me
convenci de que sua pele contrastante com a minha e nossas outras polaridades
continuariam provocando encontros e estreias fantásticas se não prestássemos
atenção àquilo que se apresentava como ponderável.
Foi quando eu quis avançar. Quando percebi
que a sua ausência já me afetava. Não vê-la sequer era saltar um dia para esperar
a próxima manhã.
A par da armadilha, migrei para o plano
racional, dei voltas e voltas estudando aquela equação sem a intenção de
resolvê-la. Positivo e negativo. Positivo e positivo. Negativo e positivo.
Negativo e negativo.
Permanecer exatamente onde estávamos era
continuar mergulhando nas escuras águas oceânicas, possuída pela fluidez do
movimento que nasce e se desenvolve intenso de dentro pra fora se projetando
para ocupar um lugar novíssimo.
Meu Deus, eu queria Gabriela, queria
Gabriela pra mim!
Seria preciso atenuar o desejo latente,
úmido e descabido, no entanto, eu avançava sublimando a sua presença, buscando
alimentar a paixão durante as situações furtivas e juvenis criadas para que
pudéssemos estar juntas. Tínhamos 17 anos novamente.
A sua ausência me afetava de forma que eu
a desejava imensamente e depois não! Passava o dia boicotando as emoções mais
verdadeiras e correspondidas que já vivi e, à noite, fechava os olhos querendo
te ter, com o coração pulsando entre as pernas. A convivência frequente e
alternada com o quente e o frio trincava a minha redoma de vidro em dias
transbordantes de dedicação ou de sutil rebeldia, também em frequência
alternada.
Gabriela sabia de tudo e perguntava:
— Tudo bem com você?
E eu respondia:
— Normal... (Exercitando o conhecimento
adquirido da literatura milenar sobre a dor e a delícia, próprias de quem
compartilha a pessoa amada. Um teste constante de autoestima que se revela num
misto mal-ajambrado de desprendimento, generosidade, resignação, perseverança,
dor de cotovelo, fé, transcendência).
Ao saber de minhas idas e vindas do plano
racional, ela se declarou surpreendida:
— Imaginei que as coisas estivessem menos
tensas, mais frouxas...
Nosso diálogo fez-se naturalmente tácito
(uma delícia) e o silêncio como expressão me permitiu guardar em segredo
impressões acerca da miséria dos amantes. Somente disse a ela que não tinha
vocação para compartilhar o amor e que pra mim não havia leveza na
coadjuvância. Por isso, de forma aparentemente contraditória, decidi criar a
invisibilidade de Angelina: a discrição como um dom. Um manto encantado que me
protegeria, permitindo que eu protegesse Gabriela. A arma secreta que me
conferia poderes para autodesintegração da matéria com autonomia para
ressurgimento estratégico.
“Saudade”, contou a minha flor pelo
telefone, entre um compromisso e outro. “Liguei pra dizer que te adoro...”. Era
o dia que antecedia nosso encontro e iniciávamos o ritual de aquecimento.
Longas preliminares nos deixavam em estado fisiológico lastimável, prontas a
perder o controle na convivência com a espera. “Deus te proteja”, jurávamos uma
pra outra tomando chá.
— Eu gosto de cama, da convivência na
cama... beijar, abraçar, conversar. Gosto de peito e também de pau. Isso eu
soube de Gabriela antes que tivéssemos experimentado muitos prazeres juntas.
Excitação pura ouvi-la falar do assunto porque é sedutora sua coerência.
Quando nos encontrávamos e dávamos
continuidade à narrativa dos corpos, tinha a impressão de que sua intensidade e
renovado interesse pela sexualidade lhe permitiria se envolver com, pelo menos,
mais uma mulher ou um homem. Até me imaginava observando do meu platô todo
mundo em seus platôs e você voando de uma plataforma para a outra. Quebrava a
asa nesse, quebrava a asa naquele. Voava pro outro em nome da saudade cortante.
Linda você!
— Não quero outras camas, quero seus
lençóis, Angelina. Sua presença me transforma. Declarou ela, interrompendo um
beijo e iniciando outro com voracidade.
Me lancei num voo de gaivota. Estávamos
juntas.
As mãos fortemente entrelaçadas acima de
nossas cabeças e os corpos trêmulos banhados de suor gravados um no outro se
afinavam. Clave de sol. Penetrei Gabriela insaciável: “Fica, fica...”,
implorava. E eu não a deixaria por nada!
Minha língua escrevia a letra da canção em
toda a superfície ao meu alcance. Gozou, gritou, livremente. Sem descanso, em
lânguida coreografia, sentou-se sobre meus dedos, cavalgando sensualmente.
Contemplei tesa a cadência da trepada, te afagando costas e bunda sem tocá-la,
te amando inteira, do meu jeito. Gozou e gritou livremente.
— Me chupa agora, Flor...
Gabriela se apresentou imediatamente.
Invadiu os grandes lábios para me devorar. Vasculhou, mapeou, sacou tudo.
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