Patrimônio Histórico da Humanidade, o Casco Antigo é um grande canteiro de obras no momento. |
Em frente à Fundación Calicanto |
O Exército marca presença nas ruas do Casco Antigo se antecipando ao retorno do presidente ao país em período de manifestação popular contra a Lei 72 |
Fotos e intervenção: Larissa Mundim. Apoio: Stephanie Lee |
Uma Mensagem na Garrafa à deriva
onde há confluência interoceânica é instigante por si, antes mesmo de se compreender
um dos maiores surtos de loucura empreendedora já protagonizados pela
humanidade. Paralisante é a visita ao Complexo Miraflores, no Canal do Panamá, onde
se vê o Atlântico e o Pacífico se batendo lado a lado.
Ali eles são fétidas áreas de oceano
lambendo a mesma estreita faixa de terra que começou a se abrir, ainda no século
19, pelos franceses, dando passagem a uma ousadia, motivada pela conquista de
poder e riqueza, banhada de sangue, intolerância e poesia. No Panamá, conheci o
meio ambiente como paisagem em movimento e agora já posso aceitar, com mais
resiliência, o fato de que nada é pra sempre.
É possível que a arquitetura, a engenharia
e a tecnologia tenham impactado fortemente na construção da cultura panamenha,
ávida por identidade própria, num contexto orgulhoso ufanista da ausência
oficial dos Estados Unidos na definição de novas escavações e aterros. De alguma
forma, existe no Panamá uma preocupação com a permanência que leva este povo a
tirar tudo do lugar, se preciso.
Regida pelo acaso, uma Mensagem
na Garrafa foi levada a este lugar tão especial, entre 25 e 27 de outubro,
dialogando com um tempo e um espaço impactantes e impactados por importantes
eventos de um país ligado no rádio e amplamente conectado à Internet. Entre
eles, o projeto de extensão do Canal do Panamá, discussões parlamentares a
favor e contra as obras de uma novíssima via, mar adentro, que deverá subtrai
áreas verdes, movimentar comunidades históricas e fortalecer o espelhamento na
plastificação de Miami.
Especialmente nos últimos três
últimos dias, também acompanhamos tão de perto um tempo e espaço marcados pelas
manifestações públicas contra a legislação que previa a venda de terrenos na
Zona Franca de Colón, ao norte da capital panamenha. O noticiário de hoje (28) informa,
no entanto, que pressionado no retorno de missão ao Vietnam, o presidente Ricardo
Martinelli cedeu à tensão política e ao apelo popular e revogou a lei, com o
Exército nas ruas há mais de 72 horas.
E foi sitiado no Casco Antigo (Centro
Histórico Patrimônio da Humanidade - UNESCO), que o Coletivo Esfinge compartilhou
uma mensagem desesperançada, mas madura. Veja aqui as fotos.
Mais sobre a ação de street art
Mensagem na Garrafa: http://www.negalilu.blogspot.com.br/p/mensagem-na-garrafa_28.html
Para neutralizar
de Laura
Passing <negadeneve@gmail.com>
para Brisa
Marin <lilucajuina@gmail.com>
data 24
de outubro de 2010 23:42
assunto Para
neutralizar
enviado por gmail.com
Nos encontros marcados com o meu limite
físico nunca levo a alma. Sigo em frente, cega e desatenta, como se me
apresentasse para o abate. Prefiro correr, porque meu movimento é de fuga.
Viajo pro norte. Você ainda está comigo.
Mergulho nas cores, sabores, perfumes. Sou oferenda para borboletas no templo
úmido e concentrado das sutilezas. Retorno sem proferir orações.
Calêndula que primeiro sobrevive ao
dilúvio e depois na Caatinga explode em uma flor amarela, tímida, vítima do
excesso e das restrições. Tomateiro nasce semeado pelo vento. Cajuzinhos do
Cerrado de caretas excepcionais se anunciam, colhendo meus olhares de dia e de
noite, sem previsão de estarem prontos para a panha. A produção continua e me
cerca. Nada morreu.
É recente meu interesse pelo pensamento
que inicia o meu dia, aquele que me ocupa no primeiro segundo de consciência. A
você dediquei esse momento por tantas vezes. Foi quando ele começou a existir.
Em 24 de outubro de 2010:
11h15, penso em você.
17h50, penso em você.
21h07, penso em você.
Minto.
Monologâmica
de Laura
Passing <negadeneve@gmail.com>
para Brisa
Marin <lilucajuina@gmail.com>
data 23
de outubro de 2010 1:17
assunto Monologâmica
enviado por gmail.com
Não me detenho por um minuto para projetar
imagens do futuro. Os planos que faço se consolidam enquanto planos na
oralidade.
Sempre falo pra mim mesma na presença dos
outros. Nunca sozinha.
E nem sempre registro as certezas que vão
me ocorrendo e que vou acumulando à medida que verbalizo meus sentimentos.
É bem assim...
Crio textos e viabilizo suas encenações
dirigidas também por mim, uma atriz dramática de monólogos.
A capital cearense integra o circuito alternativo de intervenções da ação Mensagem na Garrafa que faz circular a obra de Mateus Dutra, comentando, transformando e difundindo o conto Sem Palavras, escrito por Larissa Mundim.
Originalmente, o artista produziu 23 stickers a partir de fragmentos do texto que conta a breve história romântica de Nega e Lilu. Apropriadas por Mateus Dutra, as palavras ganharam status de imagem, tornando-se desenhos. Espalhadas pelas capitais brasileiras e levadas a outros 12 países, até o momento, a obra conta com interventores que, de forma autônoma, propõem diálogos da Cidade com o texto transformado em desenho.
Para que esta ação de street art se complete, ainda serão necessárias intervenções em Belém e Rio de Janeiro. Mas mesmo antes disso, por iniciativa de leitores do blog Nega Lilu, iniciou-se espontaneamente um circuito paralelo, percorrendo lugares inéditos, com Mensagens na Garrafa anteriormente entregues. Algo natural para uma obra que registra aberturas e fechamentos de ciclos de forma recorrente.
Conheça agora a intervenção realizada em Fortaleza pela odontóloga Cristiane Almeida e pela produtora cultural Nath Mundim. E para saber mais sobre o texto que conversa com o Ceará, leia: http://www.negalilu.blogspot.com.br/2011/07/sem-controle.html .
Sobre Mensagem na Garrafa:
Praia de Meireles |
Praia de Iracema |
Atencioso é o povo cearense. Na Praia do Mucuripe, no
ato de intervenção, um pescador se aproximou oferecendo “grude” pra Mensagem na Garrafa ficar
bem colada.
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Nega e Lilu na Praia do Futuro, em frente ao complexo de turismo e
lazer, Croco Beach.
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Últimas_fluxo de pensamento na multidão
de Laura
Passing <negadeneve@gmail.com>
para Brisa
Marin <lilucajuina@gmail.com>
data 11
de outubro de 2010 1:40
assunto Últimas_fluxo
de pensamento na multidão
enviado por gmail.com
Existem lugares separados no nascimento.
Os japoneses sabem disso!
Belém e o Rio de Janeiro têm algo em comum
à primeira vista.
Do aeroporto até o hotel encontrei três
pessoas que eram paraenses residentes no Rio ou cariocas de sotaque vivendo em
Belém.
Mas me garantiram que o que realmente há
aqui são os cearenses. Enquanto o elo que liga Belém ao Rio pode estar ancorado
à marina, o desprendimento do povo cearense deve tê-los trazido aqui, como a
outros lugares (como o Rio), ocupados no movimento de fuga. E no Ceará? Estão
lá os cearenses? Na retirada, quem ocupa?
Por causa do calor, deve haver uma
comunidade que, declaradamente, espia a vizinhança pela janela. É que as
pessoas devem ficar nuas em seus apartamentos e serem observadas de forma
consentida. Você adoraria...
Diz o cara no microfone: “Bonita cobra,
hein... Isso é o que eu chamo de uma cobra gigante!”. Não é a Festa da
Chiquita, é a comissão organizadora da procissão cultural do Círio, que sai no
sábado. A cobra é feita de material reciclável e, este ano, foi conduzida pelo
pessoal que estava pagando promessa.
“Por favor, tragam água pra eles.”
As TVs de poucas polegadas estão
instaladas em todas as bancas de água de coco na Praça Batista Campos. Elas
estão ligadas na novela das oito, na Globo. Para aqueles que estão fazendo uma
caminhada, até dá pra acompanhar a trama, sem perder nenhum diálogo. Subversão
ali é exibir um canal alternativo.
Rodrigo Faro conclama a audiência a
prestigiar seu programa Vai dar Namoro, neste sábado, na Record, que terá uma
“galera paraense tomando conta do pedaço a fim de se dar bem”.
Onde estão os madeireiros?
a) em casa (Tá louco! Sair nesse calor e
dividir espaço com 1 milhão de devotos?)
b) nos barcos da procissão fluvial
c) no Rio de Janeiro
d) com o clero conduzindo a santa
e) outro lugar
Se eu fosse agente da Banda Calypso não
perderia oportunidade de tocar no Círio de Nazaré.
Veja quem ocupa o espaço musical este ano:
Festival Círio Pop (no Palmeiraço)
Pagodão da Mansão
Gravação do DVD da banda Puro Amor (no
Urubu Black)
Forrozão do Círio
Eu sou mais o Chimbinha...
Na Festa da Chiquita, chamaram atenção os
agradecimentos feitos pelos artistas performáticos a seus patrocinadores como Sauna
Paradise, Bar da Ângela, Spa Vem ser feliz.
Ver-o-preço:
Red Bull - R$ 5,99
Edredons - R$ 10,00
Kit do Círio (fitinha, camiseta e chapéu)
- R$ 20,00
Refeição completa na Feira do Pescador -
R$ 5,00
Pargo Novo de Salinas no Mercado
Ver-o-Peso - R$ 6,00
Misturada completa do Irmão - R$ 12,00
Beijo hein. Fui.
Nega
À Cajuína
de Laura
Passing <negadeneve@gmail.com>
para Brisa
Marin <lilucajuina@gmail.com>
data 8
de outubro de 2010 19:13
assunto À
Cajuína
enviado por gmail.com
Boa noite, Cajuína!
Cheguei com atraso de 4 horas a Belém por
conta do mau tempo em Porto Alegre. Nunca duvidei de Kapra: ninguém toca uma
flor sem abalar uma estrela... (ou coisa parecida).
Envio aqui as primeiras ilustrações desta
viagem.
1) Logo cedinho dei de cara com um novo
cajuzinho.
2) O recorte feito pelo Rio Guajará na
mata, já no sobrevoo da cidade.
3) Recepção no aeroporto com carimbó. O
grupo Uirapuru cantava e dançava: “Beija devagar, beija devagar, beija
devagar... se quiser pegar”. Que delícia o leve incômodo de sua mordidinha no
meu ombro esquerdo...
4) O Círio de Nazaré está em todo lugar.
Da festa da Chiquita ainda não ouvi palavra. As ruas estão tomadas e as lojas
do centro me lembram Elza Soares. Depois do Vietnam a vida parece mais
ordinária, mesmo no Pará.
Já tenho histórias para contar. Só queria
ter certeza de que você vai acessar o Gmail para acompanhar... Fiz amigos
instantâneos e percebi que por aqui é fácil de se casar. Carlos, meu taxista
camarada, me garantiu que na época do Círio então... “Em qualquer casa se come”
(falando de almoço e janta). Hehehe.
Como a chuva já caiu hoje, vou sair agora
para tomar uma Cerpa e um Red Bull e comer uma coisa gostosa. Volto para o
hotel para trabalhar no livro. Se você estiver on-line, me dá um toque.
Beijo.
Nega
— Fica, fica,
fica...
Uma mulher regida por estímulos
sensoriais não tem manual para aquecimento e não responde às FAQ ‒ topa tudo e topa nada também. Mas aquela
desejava ser seduzida e poderia se entregar, se houvesse, além de tesão, reciprocidade,
leveza, paixão, inteligência e compreensão.
De sensualidade aflorada, Brisa
Marin era uma pessoa solta, que tinha sempre alguém em vista, gente credenciada
a se juntar a amantes cultivados com inanição ao longo de anos, espalhados
estrategicamente por todo o território nacional. A eles e a elas, dedicava-se
integralmente, oferecendo todo o amor para cada um. Da linhagem de Gabriela, era
puro proveito e fama.
E isso a Nega aprendeu. Porque a cama
com Laura Passing foi especialmente memorável. Era onde Lilu se entregava ao
naturalismo, ainda que seu sexo idealizado se aproximasse mais de Nin do que de
Miller, obviamente, mantendo-se distante de Bukowski.
A lembrança erotizada de poucas e
boas trepadas com a Nega deveria acompanhá-la até seus últimos dias. Porque não
se esquece facilmente ‒ e depois de
um tempo sempre recordamos ‒ do coração
pulsando entre as pernas, lençóis molhados, corpos suados galopantes, sangue
nas veias tingindo a face, gemido sem pudor, desidratação iminente, aroma do
mel rescendendo no quarto.
A vigésima primeira Mensagem na
Garrafa fala mais sobre a Flor de Cajueiro e, na capital tocantinense, registra seu desejo
consumado na cama com a Nega, sem portas trancadas, sem conter a voz, sem
segurar a respiração ofegante, sem tempo para acabar. Perenizados, aqueles beijos
serão inesgotáveis.
Pelo fim da malcriação (exercício 2)
de Laura
Passing <negadeneve@gmail.com>
para Brisa
Marin <lilucajuina@gmail.com>
data 3
de outubro de 2010 1:45
assunto Pelo
fim da malcriação (exercício 2)
enviado por gmail.com
Querida Brisa,
Para eufemizar o gosto exagerado que tenho
pela repetição, ultimamente prefiro dizer que a revisitação lapida os
pensamentos.
Embora sabendo que alguns dutos de nossa
comunicação mais genuína foram inibidos, selados com concreto, insisto no
assunto me ancorando na mútua compreensão que conhecemos, porque gostaria de
compartilhar com você mais este exercício.
Quando meu celular, programado por mim
mesma, deixou de fazer “Lilu”, me ressenti imediatamente.
Com boicotes também reagi a outras
artimanhas que inventei para desocupar-me de você. (O próprio conto talvez seja
uma delas!)
Em busca de entendimento, escrevo agora
sobre o assunto para visualizar incongruências e incoerências a que tenho me
submetido, até o momento em que me convenço de que o gesto perdido no ar
encerra o ato.
Veja como é interessante.
Meu desejo é tê-la sempre por perto,
contrariando a necessidade de não vê-la até que eu me recomponha. A sua
presença me fortalece e me desconcerta. (Minha fragilidade fica exposta e não
colhe afagos.)
A sua demonstração de afeto me transforma
e me faz tão bem; me transtorna e me arrasta pântano adentro.
Quando você silencia, quero te alcançar
para me revelar. Sinto-me patética em seguida.
Júbilo seguido de açoite. Um novo roteiro
kamikaze?
Grata. Beijo.
Laura