"Que bom que você existe", disse a Professora Lu, tomando a segunda e última cervejinha comigo em um bar universitário. Olhos expressivos, sorriso adolescente, voz de cantora, pele morena, 32 anos, brincos étnicos.
Com jeito cuidadoso e simplicidade foi tecendo sua história, trazendo novidades pro contexto e rememorando o que havia compartilhado comigo na sala virtual de bate papo.
Éramos duas mulheres solitárias que saíram de casa naquele fim da tarde de sábado para encontrar o mistério.
Começamos nosso chat por volta das 16 horas e objetivamente informamos uma a outra que estávamos em busca de um novo amor naquele lugar sujo de porra. No começo, Lu me encheu de perguntas sequenciadas: quantos anos? onde mora? o que faz? E pra descontrair perguntei a ela se nos últimos anos aquele espaço de encontro havia se tornado um ambiente de inquirição. "Então conduza a conversa", ordenou. E foi aí que começamos a nos entender.
A solidez do amor que sinto por Lilu, todo esse tesão represado e a impossibilidade de estarmos juntas por decisão dela me lançou numa busca lógica e inédita. Quero alguém pra mim porque eu mereço.
Uma das primeiras providências que tomei foi verificar como anda a azaração no bate papo virtual, se tinha evoluído para a sofisticação ou se estava completamente tomada por analfas e gente à toa em busca explícita de sexo. Em minha primeira incursão, após 15 anos de ausência, encontrei uma professora de Português e fui logo revelando que atraentes eram as vírgulas bem colocadas.
O jogo ainda é o mesmo e toda a mudança está em mim. O início do bate papo continua sendo algo muito especial e determinante. As abordagens me divertiram. Cumprimentei Wellington de Souza pela originalidade no primeiro contato, ignorei a conversa fiada do Ksado quer gata pra hoje e pedi ao simpático Chupo BCT gostoso que me falasse mais sobre sua disposição. Entre outras coisas, ele me disse que chupar xoxotas não é só uma disposição é uma atitude e deixou seu telefone caso eu desista da masturbação.
Falar sobre Lilu é falar sobre mim. Mas esta semana, minha psicoterapeuta aproveitou o desabafo sem tesão para me dizer sutilmente que está interessada em trabalhar temas adjacentes àquele explorado desde outubro de 2009 e que eu deveria me estimular para a discussão de outras banalidades.
Ahahahahahahaha. Valeu! Te respeito e admiro tanto sua dedicação.
Comemorando o bicentenário de independência da Colômbia e mantendo fidelidade a sua linha editorial, a revista Soho (www.soho.com.co) não somente captou a atmosfera romântica da história de Bolívar e Manuelita quanto enxergou potencial erótico.
Confira na edição eletrônica publicada em 21 de julho de 2010, a crônica softporn El Polvo de Bolívar e Manuelita, escrita por Pascual Gaviria com ilustrações de Andrés Barrientos:
Lilu, o clima instalado de “só mais uma vez” entre a gente me trouxe de volta o episódio do último encontro entre Simón Bolívar e Manuela Sáenz, após 208 anos de separação.
Ainda dediquei pensamentos a Florentino Ariza e Fermina Daza, personagens do livro O Amor nos Tempos do Cólera de Gabriel Garcia Marquez, que te dei de aniversário ‒ com dedicatória escrita com tinta invisível ‒ e que talvez não chegue a ser apreciado em sua leitura ágil, por merecer um momento de dedicação capaz de te desconcentrar do que realmente importa. Este foi, sem dúvida, um dos mimos valiosos que te ofereci com carinho nas embalagens mais esdrúxulas que pude imaginar, como aquele primeiro: o brinco de cristais que você nunca usou. Ah, Lilu... você fica tão linda de verde. Também não colocou na parede aquela tela da orgia do astronauta, único presente entregue sem embalagem tradicional da Nega.
Mas fico felicíssima quando te vejo usando como amuleto o anel côncavo de prata que lhe trouxe de Botogá, cidade por onde eu passava, em junho de 2010, e acompanhava pela imprensa o encontro marcado na Venezuela dos restos mortais de Simón Bolívar e de sua amada, depois de percorrerem o Peru, o Equador e a Colômbia, por ocasião das comemorações do bicentenário da independência desses países. Achei imediatamente romântico e precipitei-me em compartilhar.
A fim de trazer detalhes complementares ao fato jornalístico, fiz uma brevíssima pesquisa sobre a trajetória do Libertador que, para meu espanto, ainda estava presente em minha memória escolar. Lamentavelmente, a rápida busca por informações me induziu a um grave equívoco que vai merecer reparo na edição do livro NegaLilu. Erro que tanto negligenciou a amante Manuelita, em seu importante papel político para a América do Sul, quanto trouxe para a luz a esposa precocemente vitimada pela febre amarela, Maria Teresa Toro, que definitivamente não teve seus restos mortais reunidos aos de Bolívar na cerimônia passional realizada em 5 de julho de 2010.
Na ocasião, o presidente Hugo Chávez teria dito: "Simón y Manuela, los dos son la misma cosa: pasión, fuego patrio que hoy se convierte en llamarada".
A saga de Bolívar e Manuelita imortalizada no mural de cerâmica “A pátria nascendo da ternura”, criado pelo artista equatoriano Pavel Égüez. Afixado na fachada do Edifício Nacional, em Caracas, na Venezuela.
Percebeu a busca por solidão serena e me perguntou se Nega e Lilu ainda estavam juntas.
Respondi ao amigo que não. Nos encontramos apenas esporadicamente.
— Como amantes? Isso é dramático... Cada encontro pode ser o último.
(E me lembrei que ainda precisava fazer justiça à Manuelita Sáenz.)
O comentário ficou registrado porque apontava com frieza para a previsibilidade daquela situação na qual eu havia me metido. Mas favas contadas não existem. O que ninguém soube é que, atenta à clássica movimentação dos amantes, venho conseguindo manter integridade que me garanta distanciamento de arquétipos. A fé na coerência me orientou.
A ausência de Lilu me afetava e a minha presença a transformava.
Tão bom ter notícias suas, Lilu... Beijo guardado.
Consultei ontem a dermatologista que me acompanha nos últimos anos e sabe bem que minha intolerância ao sol tanto me trouxe conforto e felicidade em Londres, onde os dias não têm tanta luz, quanto desviou caminho em minha profissão.
A primeira vez que fui parar em seu consultório cheguei com recomendação da minha irmã: “prepare-se para ser vasculhada”. As médicas de pele que haviam me atendido até então nunca chegaram a pedir que eu tirasse a roupa.
Dra. Margareth sabe como seu toque é especializado. Arrepio é como tosse, ninguém evita, diferente de espirro e pum.
Deve ter ficado satisfeita com a consulta, porque não fiz feio. Dessa vez cheguei a tirar a calcinha pra mostrar uma espinha no bumbum. Foi bom.
Preocupada com os avanços da queratose pilar em meu corpo, fui consolada pela médica que esclareceu pela primeira vez de forma satisfatória sobre a faixa que atualmente ocupa área respeitável da coxa, onde atua branda, ao antebraço.
Eu pensava que era protesto à falta dos carinhos de Lilu, que me arrepia mais que Dra. Margareth, mas segundo a explicação científica trata-se de sensibilidade pura.
O Projeto Esfinge é um conjunto de ações artísticas que compartilham humanidades.
Atividades realizadas em colaboração para difundir, comentar, transformar a obra NegaLilu a partir de linguagens integradas que originam, até o momento, interface entre a literatura, o audiovisual, a fotografia, o design, a dança e as artes visuais.
Tendo a literatura como indutora das demais manifestações, o projeto Esfinge se consuma dialogando com o espaço público em território urbano e circulando conteúdo nas redes virtuais.
É dessa forma que o efêmero, o imponderável e a incerteza da casualidade assumem protagonismo na condução desse trabalho inspirado na perversão de uma demanda ancestral do ser humano: devora-me ou decifro-te.
O trabalho de Tom Friedman se apresentou pra mim ao mesmo tempo em que se escondia nos cantinhos do MAMCO de Genebra. Foi por acaso que encontrei sua obra.
Expondo a simplicidade e a objetividade, o artista me ganhou pra sempre.
Não pela cor, não pela forma, pelo discurso contido ali naquele material tão ordinário, compondo figuras tão recorrentes.
Na minha cabeça de Nega Maluca, Tom Friedman falava sobre a natureza humana: a doçura, a leveza, a pequenez.
O blog NegaLilu deverá permanecer secreto por um tempo mais.
São muitas as dúvidas.
A certeza única é a vontade de compartilhar com o maior número de pessoas a breve história de Nega e Lilu, capaz de tocar pessoas, com pureza confidente e despretensiosa.
Originado de um conto homoerótico, acredito que um encontro assim tão inspirado possa sensibilizar públicos diversos, atraindo particularmente os interessados em assuntos recorrentes no repertório das humanidades, como a plenitude do amor e o sentido da vida.
Aqueles que nunca refletiram sobre isso, mas que estiverem suficientemente atentos e abertos, espero que recebam um chamado.
Dessa forma, até que o blog seja amplamente divulgado, toda publicação se consumará cumprindo um rito misterioso de silêncio poético.
Uma vez que amar Lilu sempre foi como guardar um segredo, acho natural que o projeto se defina por um método processual e aleatório. Livre no estilo literário, sempre à deriva, sentindo os caminhos que se apresentam na busca de preservação com coerência da condução até o momento dada a esta obra de ficção.
O mesmo conceito segue migrando para outras ações deste que tenho chamado de Projeto Esfinge.
Em tempo, registro agradecimento sincero aos leitores convidados deste blog secreto.
O blog segue em crise, se definindo como espaço de publicação de conteúdo pré-existente que não integra o livro Nega Lilu e dos textos, imagens, sons que acompanham a Nega enquanto persegue tanto a solidão quanto um grande amor quanto um filme arrebatador.
A convivência com Pichincha provoca instabilidades como condição de existência do primeiro patrimônio da humanidade chancelado pela Unesco. Se as conjecturas astrológicas contemplassem também cidades, Quito então seria geminiana. As previsões são de mudança frequente.
Imagino logo que, os que residem aqui, voluntariamente ou não exercitam a flexibilidade no cotidiano e testemunham a força da natureza emprestando intensidade a suas vidas. Mas somente para aqueles que prestarem atenção.
Em períodos de atividade do vulcão, sua vizinhança fica recoberta da cinza que tanto aduba as plantas quanto se instala pesadamente como o concreto, uma vez em contato com a umidade.
Em Quito, no Equador, estamos a uma altura de 2.800 metros acima do nível do mar, abraçados por vulcões, um deles ainda em atividade: Pichincha.
Mais próximos do céu, uma névoa constante recobre a cidade, instalada no meio da Cordilheira dos Andes. Me disseram que, em dias mais descortinados, avista-se picos nevados. E a Nega sente-se em casa.
Apesar das previsões, Nega não precisou de adaptações à altitude de Quito. Atribuiu o ajuste metabólico natural à memória que seu corpo conserva daqueles dias muito próxima de Lilu, que a conduzia até as estrelas como quem a estivesse levando de mãos dadas à esquina.
Adriana Calcanhotto em Canção sem seu nome soa tão presságica quanto a canção Pelo tempo que durar (também de Adriana Calcanhotto e Marisa Monte, para minha surpresa). Curioso é perceber que a primeira surge na trilha sonora de Nega e Lilu (Parte 1) sem aparentemente pertencer a ela. E a outra, primeira a ser apresentada por Lilu à Nega, leva tempo para integrar-se à trilha (por questões técnico-emocionais) e encontra lugar na Parte 2, com participação enigmática no encerramento.
Canção sem seu nome sempre foi pra mim um motivo para voltar ao Brasil ‒ e eu estava vivendo em Londres. Quando te conheci, achei que tivesse encontrado alguém que merecesse tal canção. Ainda que ela não significasse imediatamente. Mas as coisas poderosas na vida da gente são assim, antecipam seu tempo e preenchem espaço ocupado, transbordando, arrebentando, escoando sem encontrar represamento.
Segue pra você, Lilu, uma linda canção, dedicada há muito tempo...
Canção sem seu nome
(Adriana Calcanhotto)
Eu vi você atravessar a rua
Molhando a sombra na água
Eu vi você parar a lagoa
Parada
Você atravessou a rua
Na direção oposta
Pisando nas poças
Pisando na lua
E a poesia ali me deu as costas
E pra que palavras
Se eu não sei usá-las
Cadê a palavra que traga você daquela calçada
Você atravessou a rua
Na direção contrária
E a poesia que meu olho molhava ali
Quem sabe não me caiba
Quem saiba seja sua
Ali atravessando a chuva
Toda lagoa parada
Você na direção errada
E eu na sua
Como fruta do conde
Um rio correndo pra foz
É como se a correnteza
Fosse parada
E tudo, mais tudo, mais tudo,
Fosse igual a nada
A simplicidade e a sinceridade do conto Sem palavras moveram montanhas, derreteram geleiras, deflagraram voos de gaivota, provocando o encontro entre duas mulheres e originando uma obra de autoria compartilhada, que tem como inspiração a incerteza, a urgência, a fluidez, próprias das novas mídias.
Nascida no ciberespaço, a obra se constrói vagando entre a metalinguagem e uma estética da esquizofrenia, à medida que Laura e Brisa se tornam Nega e Lilu, co-existindo em dois níveis de ficção ao invadirem o conto de concepção processual contido e enclausurado em um romance literário denominado NegaLilu.
Este conteúdo estará disponível no blog NegaLilu a partir de 6 de novembro de 2011, às 03:33.
Lilu, enquanto edito nosso livro fico pensando sozinha... E isso é ótimo, porque você sabe que sou fã da rotina, mas gosto de fazer coisas que quase nunca faço também. Sempre me surpreendendo com o quanto elas podem ser boas.
Estou em minha fase Guimarães. Quando você finalmente acessar seu Gmail eu terei terminado de assistir às mais de 12 horas de Grande Sertão: Veredas e meu casamento com Riobaldo talvez já tenha terminado. Ou talvez eu e Riobaldo ainda estaremos mantendo um romance. De leve. Se quatro meses já tiverem se passado estarei quase pronta para outra paixão. Ou estarei no ponto para ficar só.
Um dia, vivendo outro amor, Riobaldo disse: "Deus é paciência. O contrário é o diabo." E sozinha pensei que coisa linda seria aguardar até o 6 de novembro de 2011 para a publicação dos textos do livro Nega Lilu no blog Nega Lilu, buscando consonância, dois anos depois, com o dia e a hora em que foram concebidos. Um exercício de recriação de matéria e, principalmente, de deslocamento da matéria recriada de seu tempo de origem.
O que proponho que façamos é mais do que literatura, nos aproximando novamente de Sophie Calle e de muitos outros artistas contemporâneos.
A história de Nega e Lilu nunca caberia numa linguagem só.
E na sua ausência, tomei providência para não deixar que os humores colocassem as mãos nessa história e fizessem dela alguma coisa distante de sua natureza, ou fizesse nada dela.
O blog Nega Lilu é uma dessas providências por entender que seria um equívoco submeter tamanha riqueza aos auspícios de um outro tempo... que não o da explosão da obra.
A fim de preservar a poética contida nesta relação tempo/espaço sem perder um segundo mais, faço deste outro início da história que ‒ anunciando seu fim em busca de um começo ‒ começará a ser publicada em 6 de novembro de 2011.