O episódio da Nega ensopada

segunda-feira, junho 11, 2012


Loucura maior é ficar de cara. Sabendo disso, aquela Nega usava um patuá benzido sete vezes nas águas de Iemanjá. Um colar feito especialmente para ela, com conchas do mar e cristais peruanos. Uma parada étnica forte que evocava proteção diária, na passagem pelos portais de energia, que se abriam na sua presença.

Ouviu no Candomblé que tinha parentesco direto com importantes reis e rainhas da Mãe África e sua elegância e altivez eram o encanto dos tolos, dos doloridos e dos invejosos. Por meio deles, adquiriu fama de sedutora maldita, provocando a ira de pobres mortais por agir com discrição e preservar a privacidade das mulheres com quem realmente se deitava.

Entediada do ordinário, sentou-se um dia na encruzilhada e esperou, a fim de viver um clássico. E das Negas que passaram por ali trazendo oferendas, quis aquela que, tão suave e intensa, tinha potencial pra conhecer a Pomba Gira bem de perto.

Na cama, os encontros vespertinos eram didáticos e, ao anoitecer, entregavam-se ao imprevisível. A Nega mestra no tribadismo era carinhosa e enlouquecia ao sentir na ponta dos dedos o fenômeno de supra excitação da outra, que ocorria como um padrão sempre que estavam sóbrias demais. A piração de uma era derramar e a da outra, manter seco o lençol. Um prazer insustentável.

Era terça-feira, em abril, e um primeiro beijo desintegrou o patuá da Nega. Suspeição. Inspira e expira. Uma chamou todos os santos, a outra convidou: “Confia em mim”.
Havia ali um portal escancarado e ensoparam o colchão.


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